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Chu Hsi, mistérios do grande lógico chinês

Ao estudar Chu Hsi, é inevitável se deparar com uma afirmação estranha. O princípio moral de todas as coisas do universo. Pensei que era má tradução, mas depois checando melhor vi que não. Um amigo chinês me perguntou se eu tinha lido o original em chinês, mas foi piada. Eu me refiro só a traduções da língua inglesa.

Mas vamos dissecar, o passatempo favorito do nosso amigo por sinal. O que é o princípio?

Princípio em Chu Hsi é o mesmo que definição no Ocidente. Por exemplo o princípio de um computador é objeto usado para suprir a falta de memória e prover a comunicação rápida. Por que diabos Chu Hsi diz que há uma moralidade aí? O que tem a ver essa definição com agir com correção?

Essa resposta elucida creio eu, a base do pensamento dele.

Quinhentos anos antes de Descartes Chu Hsi antecipou a ciência.

E ele antecipou dois tipos de cientista: o que estuda para os outros, ou seja, preocupado com a imagem, e o que estuda para si, preocupado em se tornar melhor pessoa com o estudo.

Chu Hsi achava que o segundo tipo era o que Confúcio queria. Aquela pessoa que se compenetra no estudo, se dedica só a isso, esquecendo a competição da sociedade, ou, em termos de Chu Hsi, pessoas que esquecem suas necessidades egoístas. O estudo torna-se o foco, e as ambições são esquecidas.

Hoje em dia isso existe. Não é a maioria, longe disso, mas existe esse tipo de gente.

A definição de computador por si só não é o bem, mas Chu Hsi falava de um efeito cumulativo. Amanhã vem outro estudo, depois outro, e com o tempo você percebe uma atitude, uma apreciação das regras do universo, ou talvez, da regra do universo. A pessoa se abstrai no estudo, passa a apreciar o universo, tem uma calma advinda daí.

Na medida em que o estudo substitui o egoísmo é aí que está a moralidade do princípio.

Por que princípio e não definição de uma vez?

Aí vemos uma sofisticação dele.

Como surgiu o universo?

Ele achava possível que anterior à matéria tinha existido algo como uma lógica abstrata. Essa lógica é que deu ordem ao universo. Princípio porque a definição de universo antecede o universo. Eu não sei até que ponto a definição de cada coisa antecede a coisa. Mas a de universo parece ser mesmo anterior.

Ele percebeu na vida dele que se dedicando a entender Confúcio ele de fato melhorava, sentia-se melhor pessoa. Por que?

Talvez simplesmente porque mergulhava nas abstrações e não pensava mais em fulano que tinha lhe enchido a paciência. Como a maioria dos filósofos do bem, ele via uma sublimação no processo. Um esquecimento do mal todo que nos fizeram.

Vale ter em mente o debate com os budistas. Esses diziam que não era preciso o estudo, só a introspecção. Ele dizia que não, só vendo fora, que você verá a si mesmo. A tua verdade está no universo, contemple o universo e aí você se descobrirá.

Ambos no entanto concordam haver uma coincidência entre nosso mundo interior e o universo. Mas Chu Hsi afirma que budistas só entendem de si, não tentam entender os outros.

Você se sente melhor pessoa, mais calmo, depois que entende um novo livro do assunto de sua especialidade? Esse é um momento que você sublima aquela raiva do vizinho pelo cachorro que não para de latir? Se sim, você está fazendo o que ele pediu.

Agora, não pare. Você não pode achar que agora, terminado o estudo é a vez do cachorro. Não se desvie do rumo. Chu Hsi dizia que uma árvore que para de crescer morre. Não é verdade, sabemos, é uma metáfora. Mas é isso, ele achava que um esforço seria necessário até o fim da vida. Não deixe que o seu estudo seja efêmero, ele tem que ser vitalício.

Ele pedia que você usasse roupas simples. Sim, note-se que é consoante. Não é a imagem seu foco principal. Só um pouco. Se a roupa estiver limpa é o suficiente. Só para não ter reclamações. Ninguém esquece de sua imagem por completo, mas tem algo mais importante. O amor.

Nascemos bons, na predisposição de amar, mas o ambiente nos corrompe. Necessidades surgem. Mas você estuda, percebe que as necessidades são fúteis. E aí, o amor aflora.

Fecha-se o ciclo. Por isso que tem lá o princípio moral.

Todo mundo sabe que Confúcio gostava de formalidades, rituais. Isso é incompreensível hoje. Todo mundo quer liberdade, ninguém aguenta alguém ficar falando que caso uma pessoa mais idosa venha na sua direção você tem que se afastar, mostrar respeito, deixar a pessoa passar, e nem cogitar fazer isso pelo sorriso de agradecimento. Quem quer saber qual a curvatura ideal das costas ao cumprimentar tal tipo de gente?

Aqui no Brasil sobretudo. A informalidade é total.

Agora, alguém faz um ritual bem só sendo formal?

Isso Chu Hsi sabia desde os treze anos. Confúcio achava que sem amor nenhum ritual valia.

Então, o conceito principal é de fato o amor.

Amor aqui é amor pela humanidade, nada a ver com psicanálise.

Mas é trabalhoso. Não adianta só dizer que você vai amar. O caminho é mais difícil, você tem que estudar. E não é o objeto do estudo a solução. É a atitude que é a solução.

A questão que surge talvez seja: é só mesmo substituir o egoísmo pelo estudo, ou há algo de amor na lógica?

Eu como um lógico tenho sentimentos dúbios. Queria que houvesse amor na lógica em si, mas por lógica sei que não sei isso aí.

Ele gostava do milefólio. Achava que era possível ver o futuro. O que ele tinha em mente aí?

Chu Hsi se definia como um comentarista. Não trazia nada de novo, só ajudava a entender Confúcio. Confúcio acreditava no I Ching ele tinha que explicar isso, não ter opinião prórpria a respeito.

Eu não sei essa parte por completo. Mas é interessante o seguinte. Ele achava que ao consultar o I Ching você via algo ruim de incipiente em você, que você tinha que mudar. Isso não é exatamente o futuro, não estaria em desacordo com o século vinte. Estaria de acordo com a prudência dele. E vemos aí a atitude dele. Confúcio por definição sabe, a ele cabe ver a lógica por trás.O milefólio não seria o fecho do espetáculo? Estudando o I Ching o sábio se conecta a todo o universo, e a maior prova é que consegue prever o futuro?

E esse cuidado todo? Todo o tempo se esforçando, todo o tempo sendo humilde, não é mesmo meio que consoante com o que se espera de um bom cientista hoje em dia?

Eu acho que Chu Hsi teria gostado de conhecer o Carl Sagan.



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