O princípio da explosão na psicanálise

Na Roma antiga quando algo não tinha lógica nenhuma, dizia-se " se eu aceito sua afirmação, tenho que aceitar qualquer uma".

Ou seja, se você diz que há cavalos azuis, e eu concordo, então tenho que me preocupar com um imenso exército de amazonas, com o rio Nilo secando, com o Sol não nascendo amanhã.

Hoje em dia isso tem um nome: princípio da explosão.

Um dos meus maiores desconfortos com a psicanálise foi esse.

Veja o leitor, a autoridade em questão lhe diz para ser espontâneo.

O que acontece. Sem o consentimento da razão, a primeira coisa que nos vem à mente é um tanto, não totalmente, mas um tanto explosiva. Ou seja, se há o precedente de que posso xingar meu pai, então muitos outros comportamentos inconvenientes ou até perigosos, são legitimados.

Muitas vezes, alinhado com a psicanálise, vem o famoso " isso é cultural" , que as feministas tanto gostam de falar.

Não surpreende, porque também é explosivo. A cultura existe justamente para prevenir a explosão nos grupos humanos. A divisão das tarefas, os rituais de iniciação, os casamentos, os funerais, tudo isso existe porque há uma necessidade de regras. Não existe grupo humano sem regras. Não há quem possa viver num estado biológico, anterior à cultura, ou num estado de total espontaneidade.

A psicanálise parece se preocupar com um indivíduo esquecido, alguém que foi silenciado, e agora tem a oportunidade de falar.

Eles sempre se apresentam assim.

Mas e depois? Certo, fui silenciado, boa parte de nós foi mesmo. Mas segue-se algo?

Aí que mora a coruja.

Porque ouve-se para sermos nós mesmos. E o que é isso?

É uma solução de um complexo de Édipo mal resolvido, estamos travados porque lá atrás nosso pai nos proibiu nossa mãe e não aceitamos direito.

E hoje, pelas mãos mágicas dessa gente, readquirimos nossa auto estima, e podemos fazer o que nos der na telha.

Escapa-se de Édipo, mas mergulha-se na explosão.

Se você diz, sou assim, está bom, se diz sou assado, também está bom.

Tudo fica confuso.

É problema?

Não, é muito bom, porque o ser humano é feito de dúvidas e contradições, e agora o paciente, em superior estado de consciência, percebe esse fato.

As palavras soam românticas. Mas dúvidas e contradições, são exatamente o que se experimenta nesse estado explosivo. Se tudo vale, esses dois tornam-se inevitáveis.

Os psicanalistas valorizam essas palavras. Aceitar suas dúvidas e suas contradições.

Só que eles estão falando de dois estados mentais desagradáveis, sofridos,e que o ser humano busca evitar desde o início dos tempos.

Os próprios psicanalistas evitam esse estado.

O que acontece é que se uma ideologia aceita tudo, fica às vezes apelativa, e difícil de se criticar.

Aqui no meu consultório, se você achar que cavalos podem ser azuis, você pode sentir-se à vontade para dizer.

Certo. E fora do consultório? E o que você me devolve da minha afirmação?

Essas duas perguntas não são respondidas.

O problema é que a maioria que faz psicanálise, não percebe isso.

Porque não pensa muito.

A pessoa se sente valorizada, porque até quando afirma que cavalos são azuis ela é ouvida.

Mas alguém inteligente vai ter pesadelos com cavalos azuis.

Esse foi meu problema central com essa ideologia.

A busca do indivíduo perdido atrai, mas depois a ausência de regras desespera.

Na minha adolescência queria circular bem pela cidade. Não muito mais do que isso.

E ai?

Por um lado percebia que em qualquer lugar há costumes a serem seguidos.

Mas por outro, a explosão.

Parecia que no dia em que me tornasse espontâneo, me tornaria forte e tudo mais.

O problema foi que explodi antes.