Retórica, a virtude esquecida
Muitos estudantes de estoicismo aprendem que a única coisa que controlamos é nosso comportamento virtuoso, e numa fantástica coincidência também isso é o único que precisamos para sermos felizes. No entanto, se fazemos uma segunda pergunta, o que é de fato a virtude, entram em dificuldade, apenas citando que deve ser sabedoria, temperança, coragem e justiça.
Qual era a meta dos estoicos afinal?
Como já falei em outras oportunidades, minha opinião pessoal é de que era uma mente vazia, semelhante a muitas religiões orientais. A partir disso que se seguiria o comportamento virtuoso. Creio que há muitas consequências de uma mente vazia. Que se manifestam também na nossa maneira de nos expressar. A nossa retórica.
Não achei muito sobre isso. Mas sou um homem muito lógico, meu passatempo favorito é ficar concluindo coisas a partir de pouca informação.
Vocês já observaram que os congressistas americanos se esforçam para falar um inglês correto, mas não os brasileiros?
Teoricamente a linguagem correta seria mais estoica do que uma incorreta.
Mas vou defender o meu país.
A retórica estoica não podia ser coerciva. Importava expressar sua ideia, e não usar de subterfúgios para convencer o ouvinte. Às vezes, uma linguagem gramaticalmente correta apenas se destina a convencer o ouvinte. Você se abster disso, e fazer erros ocasionais, pode ser um indicativo de honestidade. Você não posa de intelectualmente superior, você tenta ter a linguagem de seus ouvintes, para que não passe falsidade. Alguém que use de uma linguagem distante, pode estar fazendo isso para usar dessa distância para induzir o ouvinte a concordar com sua ideia. Falando com erros, você pode estar dizendo simplesmente que não quer enganar, não quer sofisticar para convencer o mais simples. Você não abusa de uma intimidação que um intelectual pode usar para seu proveito.
No final das contas, o aspecto popular do congresso brasileiro, pode até ser mais estoico.
É interessante também que aquilo é um ambiente onde as pessoas são pouco vulneráveis às opiniões alheias. Sabidamente uma característica estoica.
Não creio que aqueles políticos sejam adeptos dessa filosofia. Isso são possíveis impressões de quem assistiu a CPI. Fora daquele ambiente creio que apareceria tanto o desejo de coerção como a vulnerabilidade às opiniões dos outros.
Mas pode ser que foram eleitos por anseios estoicos de nossa população. Querem pessoas que não pareçam estar se escondendo. Ou talvez, a minha palavra favorita, querem alguém não competitivo lá.
Não adianta fazer um perfeito discurso sobre a desigualdade social, se for parecer que você apenas quer soar aquilo. Ou pior, que você usa aquilo para sentir-se superior. Ou que você está querendo enganar.
Contrariamente à opinião de Cícero, o discurso estoico às vezes pode ser o mais convincente.
Nem sempre, mas às vezes alguém que soe estar apenas querendo expor sua opinião, mesmo sendo essa opinião diferente da do ouvinte, pode agradar e até convencer o ouvinte.
A despretensiosidade dos estoicos às vezes funciona.
Uma coisa interessante é a eleição do Bolsonaro.
Os eleitores sabiam que ele não representaria os interesses das classes populares. Pesquisas de opinião pública confirmam isso.
Se ele vai defender justamente os responsáveis por sua baixa renda, por que diabos votar nele?
O Bolsonaro foi muito votado por setores conservadores da sociedade. A oposição dele ao LGBT acredito que lhe rendeu muitos votos.
Não vou julgar esse movimento. Quero apenas tentar entender.
Percebo que o movimento romântico é a ideologia que hoje predomina no mundo acadêmico cultural do Brasil. Ideias de quebrar regras, de viver intensamente e de liberdade sexual são amplamente aceitas. O romantismo soa até mesmo como inquestionável. Mas não está necessariamente correto.
Talvez alguns populares percebem ( na minha opinião com razão) que muitos propagam ideias românticas como um disfarce. Numa ânsia de aceitação, mesmo de parecer superior, auto declaram-se românticos. Não usam a palavra, mas a ideia aparece por exemplo quando condenam a homofobia talvez simplesmente porque está na moda falar isso, sem nenhum conhecimento de causa. Alguns eleitores talvez percebam certa falsidade do romantismo. E aí, quando vêem o Bolsonaro ter coragem para ir contra a corrente, ele torna-se um herói.
Ir contra a corrente é um valor estoico.
Dirijo um grupo de ajuda mútua de pessoas com esquizofrenia.
Vejo dois principais inimigos dessas pessoas. A indústria farmacêutica e o romantismo. Psicólogos via de regra são românticos, e cruelmente oferecem a seus clientes essa visão como se fosse a única possível.
O meu sucesso com essas pessoas talvez se deva em parte ao fato de que evito a retórica romântica. Não tento convencer elaborando sobre artistas e pensadores românticos inquestionáveis. O intenso sentimento desses mais sensíveis que seria a nossa salvação.
Ideias de que não há certo e errado. De que qualquer prática sexual é válida, somente a abstinência estaria errada. De que temos que participar do mundo. De que ninguém é feliz se não participar. De que o retorno do outro é coisa imprescindível. De que seremos felizes em função de relacionamentos sexuais felizes.
Ao contrário, como estoico considero nenhum erro na oposição à essas ideias. Cuido apenas de não querer modificar ninguém.
Uma vez mais, quando o estoico apenas expõe sua visão, sem querer convencer, talvez sua linguagem seja melhor mesmo.
A retorica romântica é coerciva. Intervencionista. Quer mudar o ouvinte.
A vida contemplativa pode ser a melhor das vidas. Só que como isso não é romântico, os psicólogos caem em cima. Você tem que participar. Não por querer ajudar o próximo. Mas porque só existe felicidade na ação. Você tem desejos que se não satisfeitos vão te arruinar a vida.
Parece que quem não quer participar é porque queria ser gay e reprime.
E se não tem problema querer ser independente? E se não tem problema em querer eliminar seus desejos? Desejos de toda ordem?
Ou talvez simplesmente se não for a sexualidade a discussão da vida?
Algumas pessoas com esquizofrenia são abstêmias. Os românticos vêem nisso o pior dos pecados.
Mas não os estoicos.
Pessoas com esquizofrenia muitas vezes estão com o saco na lua da competição. Não apenas por perceberem a vacuidade de vidas assim, mas também porque são colocados como os últimos. Daí chega o psicólogo e lhes diz que isso é parte da vida, eles tem que participar. Como estoico diria que evitar a competição é total virtude, e que participar nesses termos é um erro sim.
O romantismo está errado.
O estoicismo está aí para dizer isso.
Hoje em dia ninguém cresce. Apenas alguns dizem ter sexualidade complexa para soar adulto. A coisa mais chique no romantismo são as dúvidas sexuais. Aí atinge o romântico o seu ponto máximo. Tenho dúvidas sobre minhas preferências.
Não pode haver charme maior.
Agora, o que importa mais é Deus. Seja Jesus ou o Logos. Por isso eles gostam mais de mim e o Bolsonaro é eleito.
Porque quando as dúvidas sexuais são o maior status, revivemos os tempos da corte francesa. Só muda a cor do sangue. Não é mais azul. Agora é cor de rosa.
O Bolsonaro foi eleito porque muitos brasileiros percebem que é hora de por um fim nessa ideologia. Tem coisa muito mais importante do que seu charme.
Outro aspecto do Bozo, é um discurso que soa masculino.
Você pode ver isso de colocar suas dúvidas sexuais como o máximo de sua vida como falta de virilidade.
Discursos muito incertos às vezes parecem femininos.
Muita gente quer de fato uma figura masculina no poder.
Os românticos via de regra falam do lado feminino.
Pagam perdendo a eleição.
Sou um homem de esquerda. Estoicos me soam como contrários a privilégios.
O discurso romântico é a maior justificativa da direita. Nova Iorque tem pobres mas isso vale a pena porque lá os gays podem viver melhor.
Não tenho nada contra gays.
Apenas observo que a retórica romântica não é boa. Talvez na arte.
Mas não na política ou em grupos de ajuda mútua.
Acho que aí vai melhor o estoicismo.
E esquizofrênicos e populares do Brasil o percebem subconscientemente.
O que nos é oferecido é uma cartilha de comportamento romântico. Diga que você tem paixões em sua vida. Diga que quando você faz sexo você considera o outro ( sobretudo se você for virgem). Diga que você adora as diferenças. Diga que você não gosta da pobreza e opressão dos negros americanos ( nunca esqueça de falar um pouco dos EU) mas que o comunismo é pior. Diga que você gosta do Tao Te Ching ( tomando o cuidado de não dizer nenhuma ideia que realmente está lá).
Assim sua dose de remédio não vai aumentar.
Mas caso você se distraia, e pare de mentir ao psicólogo, ainda tem uma salvação. Diga que você tem certas dúvidas sexuais. O relatório enviado ao psiquiatra muda.
Você tem de um lado isso. Essa gente que nunca cresceu, mas que percebe que se disser ter dúvidas sexuais vai soar madura e charmosa.
De outro pessoas para as quais o assunto não é relevante.
Para estar do lado certo sem correr imensos riscos é melhor não estar nas mãos de psiquiatras.
Mas quando o Bozo é eleito pode rir.
( Ele não sabe nada, foi o Steve Bannon que falou para ele falar assim, mas tudo que queremos são revezes de nossos algozes) .